Já era noite, o sereno caia e o silêncio pairava... depois
de alguns estudos, resolvi dar um tempo para o cérebro e o deixei descansar
refletindo as palavras de um bom e antigo clássico da literatura espanhola: Dom
Quixote de La Mancha. Qual não foi minha surpresa, comecei a identificar ali
muito de nossa sociedade atual.
imagem da internet |
Amor, ilusão, ganância, loucura, cultura e “burrice”. Começo
a pensar que a verdade está no paradoxo. Ao som do sopro do vento a assoviar lá
fora, meus olhos corriam o texto e minha mente conseguia visualizar tais cenas
de Dom Quixote: um homem culto, porém louco. Deixou sua casa, despojou de seus
bens para viver de suas elucubrações mentais. Em nome de sua loucura, de sua
ilusão e de seu amor, eterno amor, Dulcinéia, é capaz de lutar com moinhos de
vento pensando ser gigantes, é capaz de assassinar puros pensando ser grandes
inimigos e ainda livrar da culpa o culpado julgando ser inocente.
Dizia minha mãe que de louco todo mundo tem um pouco. Às
vezes, penso eu, que somos um pouco de Dom Quixote. Há em nós loucura,
intrepidez e ilusão. Somos capazes de vivenciar as mais diversas aventuras para
alcançarmos nossos objetivos e assim, como o personagem espanhol, às vezes,
quando nosso sentimento se sobrepõe à razão, perdemos o juízo e em nome de
nossa ilusão ficamos cegos àquilo que a realidade verdadeiramente é.
Dom
Quixote fez, criou um mundo para si (ainda estou na segunda parte do primeiro
volume), para sustentar suas ilusões, mesmo apanhando e sendo ferido não liga,
supera toda dor porque sua intenção é deixar feliz seu amor e travar as mais
honrosas batalhas. Se ele vencia qualquer obstáculo para alcançar um sonho
irreal porque às vezes tememos dar passos para alcançar objetivos mais do que
reais e concretos?
E seu fiel companheiro? Sancho Pança. Pobre coitado. Vê em
Dom Quixote um exímio cavaleiro, mas tudo isso porque Dom Quixote lhe prometeu
dar terras. Sancho, um homem pobre, sem muita sorte na vida, mas com boa
família, foi influenciado pela loucura de Quixote e deixou sua esposa e filhos
para conseguir dignidade às custas de uma ideia que é mera ilusão. Não sei o
que mais cega o homem se é a ilusão, de Dom Quixote, ou a ganância, de Sancho
Pança. Das duas fico com ambas, afinal, por uma se fica cego por ignorância e por
outra se cega por burrice.
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Precisamos talvez, deixar de lado a ilusão que cega, mas
devemos assumir de Dom Quixote a loucura de lutar por aquilo que acreditamos,
dispostos a vencer todos os obstáculos... pensando essas coisas, minha mente
viajava na leitura e descobri que quanto mais leio Miguel de Cervantes,
"D. Quixote de la mancha", mais consigo identificar os D. Quixotes de
nossa sociedade, bem como os "Sanchos Pança" que dela fazem parte, um:
culto, mas louco... o outro: ignorante, mas ganancioso.
Fechando o livro, olhei no relógio, já era tarde... deixei
então os dois companheiros com suas alucinadas aventuras e fui pra minha
cama... pensei: em breve os encontrarei novamente, talvez relate aqui o
reencontro e é bem provável que algumas ideias acerca desses dois personagens
estejam mudadas. Até um próximo texto, mas encerro este deixando pra você
refletir as palavras de Erasmo de Rotterdan: “a pior das loucuras é, sem
dúvida, pretender ser sensato num mundo de doidos”.
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