quinta-feira, 30 de junho de 2011

O carro e a estrada

Partia eu para mais uma missão, cidade de destino: São Carlos, SP. Assim como as outras viagens que já narrei por aqui, essa também me reservava uma surpresa. E que surpresa! Como eu estava há alguns quilômetros de distância do lugar onde iria me encontrar com os jovens sãocarlenses, um amigo ofereceu-me uma carona, de prontidão, aceitei. Combinamos tudo uma noite antes, via telefone.
O dia amanheceu... levantei cedo, revi alguns pontos de minha pregação para aquele dia...tomei um banho...café da manhã... fui escovar meus dentes e quando estou quase acabando ouço um carro. Terminei de arrumar minha mochila, coloquei-a nas costas e ao sair no portão, a surpresa: pense num carro que já não se produz mais...pensou? esse era o carro que eu ia viajar. Muito antigo, porém bem conservado.
Esbocei um sorriso, mas não disse nada, afinal eu sabia que iria aprender algo com aquela viagem. Entrei no carro, sentei-me, ao puxar o cinto de segurança dei-me conta de que não havia... enquanto rodávamos pelas ruas da cidade na qual eu me encontrava, me sentia como num dos filmes dos anos 70 com aquele carro, repito, antigo, porém, conservado.
Entrando na rodovia, fui olhar pelo retrovisor, para ver se vinha algum carro atrás, notei que o carro possuia apenas um retrovisor. De imediato pensei: não chegarei hoje! Mas, o ‘carrinho’ andou muito bem, e ainda ultrapassou dois carros na estrada.
Cheguei dez minutos adiantado no meu destino, foi uma aventura e tanto, mas também foi uma escola. Fiquei a pensar em tudo o que aconteceu e como aconteceu, e não é que aprendi uma lição com tudo isso. Comecei a pensar que às vezes as pessoas são para nós ou nós para as pessoas, somos como esse carro, nós as subestimamos ou vice-versa, achamos que elas não são capazes, mas basta acreditarmos e elas poderão realizar grandes coisas.
Eu não conhecia o carro, mas o dono sim, o motorista sabia o quanto o carro era bom, a ponto de oferecê-lo para essa viagem. O mesmo acontece conosco, Deus sabe o quanto somos importantes e capazes, por isso nos chama a andarmos na estrada da vida, cientes de que Ele acredita em nós, mesmo que as pessoas que nos acompanham pensem que não temos valor ou capacidade alguma.
A você, irmão, que prontamente ofereceu-me essa carona e acreditou nas capacidades e se doou, muito obrigado por ter me ensinado belas coisas sobre o valor das coisas, das pessoas e de mim mesmo.

As pipas e os pássaros

O sol já se punha. Pela janela do ônibus eu via o passaredo a dar seu show nos céus. Pássaros sempre foram animais que admirei, sempre os vi a voar tão livres. A liberdade chama minha atenção. Ainda há poucos dias eu estava pensando nessa liberdade que os pássaros possuem e cheguei à conclusão que pagam caro por ela.
Às vezes ao contemplá-los exclamava: “como eu queria ser um pássaro!” Olhando para eles, pensava comigo: mas são animais que ficam muito expostos aos perigos da chuva e do frio. Nisso se assemelham conosco, é bem verdade que não podemos voar, mas somos livres para caminharmos por onde quisermos, mas esse caminho nos expõe a riscos que somente se confiarmos em nossos passos, poderemos seguir em frente.
O ônibus seguia sua rota, as paisagens passavam como quadros pintados por um artista mais do que profissional, em meio a tanta natureza, eis que um dedo de humanidade surgiu nos céus. Fixei meus olhos e notei que eram várias pipas (brinquedos que voam fitos de varetas de bambu e papel de ceda, amarrados por uma linha).
As pipas são “pássaros humanos” que possuem sua liberdade no carretel de linha da pessoa que o manipula. Quanto mais linha a pessoa solta, mais longe e mais alto vai a pipa. Pássaros, pipas, homens, mulheres... temos uma liberdade de pássaros ou de pipas?
Penso que as pipas são o desejo e anseio dos homens de voar e serem livres, exteriorizado numa folha de ceda, unida a varetas de bambu e amarrados por uma linha, essa é a pipa, que voa onde os homens querem. Um simples detalhe faz toda diferença. Quando vem a chuva e o frio muito forte é muito difícil ou quase nunca vemos as pipas nos céus, o que nos faz pensar que elas não enfrentam dificuldades como os pássaros.
Talvez seja por isso que os pássaros cantam tão bonito, é um canto de vitória pelos obstáculos superados na noite, momento em que os predadores mais atacam, obstáculos superados na chuva, quando precisam se esconder. Talvez seja por isso que em todas as manhãs e depois de uma tempestade, ouvimos os cantos e vemos a alegria dos pássaros, como se dissessem: mais um dia passou, mais uma dificuldade foi enfrentada. “Sentimento esse que pipa nenhuma possui. Às vezes penso que nascemos para ser como os pássaros, mas vivemos e insistimos em viver como pipas.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

O giz e a lousa

Quem dera ao giz e à lousa poder ensinar sem que alguém os manipulasse. Nesses quase seis anos trabalhando com adolescentes e jovens, uma das maiores perguntas que chegam até mim, através deles é: porque filosofia é tão chato? Eis a resposta: porque seu professor não sabe ensinar filosofia!
Às vezes fico me perguntando: como pode um ser fazer três anos de faculdade, sobre um curso maravilhoso, que é a filosofia, e só aprender a destruir, de maneira equivocada, a fé das pessoas que o cerca. Seria isso a filosofia? Não.  Ela seria estéril se se resumisse em questionar a fé ou em trazer assuntos polêmicos apenas para que o professor mostrasse aos alunos que conhece mais do que eles.
Inocente professor! Seus alunos sabem mais do que você, porque enquanto se preocupa em instigá-los a dar respostas para questões fúteis, eles realizam perguntas muito mais profundas sobre a vida, sobre a existência de si e de sua relação consigo, com o outro e com o divino.
Um lembrete aos professores: seus alunos não têm culpa alguma de suas crises internas... Se sua experiência de vida é ruim deixe-os fazerem suas próprias experiências. Limite-se em ensinar filosofia e em filosofar, não em ficar jogando sobre seus alunos suas revoltas egoístas, para elas bastam uma boa atualização do pensamento.
Faria tanto bem uma filosofia bem ensinada. Os alunos teriam capacidade de crítica, iriam lutar pelos seus direitos, iram lutar por uma sociedade justa, fraterna. Quem dera se alguns professores de filosofia de hoje fossem como os de outrora, levantavam problemas que eram pertinentes e careciam de reflexão, quem dera se alguns alunos de hoje fossem como os de outrora, que questionavam, problematizavam, não tinham medo de perguntar ao professor. Mas hoje o aluno se vê incapaz de questionar o professor, porque o ‘prof’ já internalizou no aluno que ele é objeto e está ali não para questionar, mas para aprender. Aliás, a atitude de crítica e reflexão é tolhida ao ser humano desde pequeno, quando na idade dos porquês, vê suas questões tornarem-se motivo de bronca dos adultos.
Ora, não se aprende questionando? Então temos a solução, parafraseando as palavras do filósofo Marx: alunos, uni-vos! Questionem seus professores, interessem-se pelo assunto, investiguem, queiram saber. Não tenham medo de mostrar o que pensam, levem problemas para serem resolvidos nas aulas. Claro que aprendendo a argumentar corretamente e sempre respeitando o professor e os colegas, que também estão e devem estar buscando uma vida de maior reflexão e compreensão.
A filosofia não é algo apenas para quem a estuda, mas é algo para a vida de todos, todos fazemos filosofia a partir do momento que assumimos e realizamos atitudes filosóficas, o que é isso? É ser criança e perguntar o por quê? O quê? De tudo para assim, chegarmos às verdades nas respostas que tanto procuramos.
Professores de filosofia, não apenas questionem, mas ensinem caminhos para que seus alunos encontrem respostas... Atenção! Aponte caminhos, não o que você acha ser o certo, mas apresente-lhes todos os possíveis e deixe que eles façam uma reflexão própria e encontrem a verdade das coisas, desvelando a realidade a partir dos conceitos ensinados com o seu giz e sua lousa. Contudo, não se sintam ameaçados e nem desvalorizados, porque nós, infelizmente, por primeiro nos desvalorizamos, saibam que quanto mais vocês nos ensinarem a refletirmos e lutarmos por um mundo melhor, mais iremos construir um mundo belo pra nós e pra vocês.

terça-feira, 7 de junho de 2011

O 'selinho' e a saudade

Destino da viagem: Campinas, interior de São Paulo. Lá estava eu, em mais uma viagem, após mais uma missão cumprida. O cansaço era inevitável, porém, a alegria de ter se sentido útil na vida de alguém, na vida de alguns jovens me motivava.
Mochila nas costas, bilhete de passagem nas mãos, apresentei-o ao motorista, ele muito cordialmente desejou-me boa viagem, esbocei um sorriso e desejei também a ele, afinal, seria uma boa viagem se ele dirigisse bem.
Comecei a subir as escadas do ônibus e ao olhar para os primeiros bancos vi uma senhora, com os olhos brilhando, e não era o reflexo de seus óculos, mas era seu olhar dizendo-me: anda moço, entre rápido, para que o ônibus possa partir! Li logo o que me diziam os olhares da vovó...entrei no corredor, procurei meu lugar, que por sorte não estava ocupado por alguém que havia confundido o número da plataforma que embarcou com o da poltrona que iria sentar.
Tirei a mochila das costas, sentei-me, fones de ouvido: trilha sonora pras longas três horas e meia de viagem que começava a enfrentar. Após um cochilo, uma conversa com o companheiro ao lado, chegamos no posto, praticamente todos desceram, exceto a vovó, que aguardou ansiosa em seu lugar.
Após um lanche rápido, todos voltamos para o ônibus que seguiu sua rota. Enfim, cheguei ao meu destino, saindo de um breve cochilo, que fora interrompido pelas gargalhadas da poltrona vizinha, vi ao longe o ônibus se aproximar de Campinas, as luzes da cidade pareciam estrelas, mas vim a descobrir que para a vovó pareciam setas que indicavam o motivo de sua ansiedade.
Enfim na rodoviária, o ônibus parou, coloquei a mochila nas costas, dirigi-me para a saída ao passo que vi a vovó na janela acenar para um senhorzinho de sorriso simpático, óculos, e boina. Como ela estava na janela dependia da pessoa que estava no corredor dar lugar para ela passar... pois bem, notei o aceno, desci na frente, andei um pouco e parei para observar a cena, talvez rara nos dias de hoje.
Desceu um rapaz, depois uma moça, e a vovó logo atrás ajudada pela mulher que estivera ao seu lado durante toda a viagem. No entanto, a mulher nem desceu do ônibus, quando a vovó chegou no ultimo degrau da escadinha o vovô já estendeu os braços, e a recepcionou.
Minha mente já pensava: que bonito, será que vai rolar um beijo de boas vindas? E não é que teve mesmo, que cena maravilhosa. Um ‘selinho’ selou o fim da saudade de uma vovó e de um vovô. Juntos, abraçados, um apoiado no outro, saíram da plataforma... contemplei por um instante a cena...lembrei-me que precisava comprar passagens, pegar o circular para casa, já estava atrasado!
Continuei a andar, seguir meu destino, mas aprendi nessa viagem: não importa o quanto o tempo passe, o amor sempre permanece, há uma música chamada “Amor nunca morre” do padre Zezinho e diz o seguinte: “amor que é amor nunca morre, mas pode também suceder, que falta de quem o cultive ele viva pequeno e não chegue a crescer.”
Ame as pessoas, cultive amor, para que ele nunca morra e assim possa estar sempre crescendo e envolvendo sua vida. Que o verdadeiro amor possa aquecer os nossos corações nesse tempo de frio, afinal nas palavras do poeta Luis Vaz de Camões: “amor é fogo que arde sem se ver”. Amemos e nos deixemos amar. Nos simples gestos cultivamos o amor. Você já o cultivou hoje?

segunda-feira, 6 de junho de 2011

A revolta de um brasileiro

Quatro de junho de dois mil e onze! O Rio de Janeiro amanheceu como passarela de desfile para os órgãos responsáveis pela ordem pública do Estado. Eu estava me preparando para viajar... acordei, banho tomado, mala pronta, pensei: vou ouvir um pouco de notícia antes de sair. Liguei o rádio, jornal da CBN fazia a cobertura da manifestação dos bombeiros no Rio de Janeiro. De imediato liguei o computador, acessei o site de notícias da Globo (G1), e estava lá! Homens de honra lutando pela sua dignidade.
Porém, meu rosto corou de vergonha quando vi autoridades públicas dando ordem a outros homens fardados para entrarem no quartel que até então estava sendo ocupado pelos quase 2 mil manifestantes, incluindo bombeiros, mulheres e crianças. Que país é esse? Que governo é esse? Quer mostrar serviço, quer fazer bonito pra estrangeiro ver?
Segundo as notícias, os bombeiros que ganham um salário de R$950,00 estavam reivindicando reajuste salarial e vale transporte. Já há dois meses tentavam negociar com o governo esse aumento, que até então não chegou. Eu queria ver esses ladrões de gravata sem os auxílios que ganham.
Meu texto é de revolta! Cansei de ver homens de farda e uniforme se escondendo em roupas tão dignas. E isso se aplica aos muitos que nesse país usam um paletó e gravata e se sentem os donos da verdade.
O país está cansado desses opressores, mentirosos. Está, há mais de uma semana, pipocando protestos no país, seja no Pará, por conta da construção da Usina Belo Monte, seja em São Paulo com a greve dos transportes públicos, e agora, no Rio de Janeiro com os bombeiros.
Vamos parar de fazer vista grossa! O povo quer viver em paz e com dignidade. Não quer deixar os ricos mais ricos. O povo quer justiça! Só isso, alguns políticos fazem vista grossa, continuam aprovando leis e mais leis para que o bolso deles encham cada vez mais, vinte vezes mais, e para que alguns nesse país tenham vinte vezes menos.
É hora de mudar isso! Cadê os jovens? Cadê a voz do povo? Cadê a justiça e o caráter desse país? Que gritem os povos clamando sua liberdade e esse grito possa ser uma “bomba de efeito moral”, para essa gente que não tem moral alguma e quer vir falar de ordem pública e justiça. Desordem pública é o dinheiro desviado pelo colarinho branco, desordem e desrespeito com o patrimônio público é ter cada vez mais empresas querendo privar pessoas de estarem no seu lar. Vergonha e revolta de um brasileiro que somente gostaria de ver o seu país mais justo, mais solidário, mais fraterno, mais verdadeiro. Como se omitir diante de tudo o que está acontecendo?