terça-feira, 13 de agosto de 2013

Palavras ao mar

Vamos? Vamos para o mar! Não vamos entrar... só molhar um pouco a planta dos pés...sentir o mundo passar em águas bem sob nosso calcanhar... vamos? Sentar beira mar, contemplar sua imensidão..sentir-se nada, mas perdendo-se no tudo...vamos?

Oh proposta irrecusável! No entanto, as circunstâncias nas quais se encontrava o impossibilitavam de vivenciar esse tempo anódino. Era na verdade um grande convite para um momento capaz de refazer as forças, de amenizar as dores causadas pela caminhada. Às vezes somente no parar se pode entender o caminhar, no entanto, parar também deve ser um modo de se continuar em movimento; por isso parar descansa, não só por refazer forças físicas, também forças interiores, afinal no parar está a espera do tempo certo para se levantar e seguir caminhando.
Não sei se por acaso ou por providência divina ou por coincidência mesmo...mas certas coisas da vida que acontecem no agora penso que não teriam o mesmo gostinho do depois. Sendo assim, há momentos que gostaríamos muito de vivenciá-los no agora, mas vale esperar, vale pensar cada momento, preparar cada instante porque o agora que queremos será o depois que esperarmos...e no depois, ah! Alcança-se o prêmio deveras e o desfruta no tempo; tempo que parece parar, que parece se eternizar só para ficarmos a sós e olharmos pra trás com as palavras nos lábios: “valeu a pena esperar”.
E foi isso o que aconteceu: o momento tão desejado por um, foi querido por outro, mas impossibilitados de irem no ‘agora’ pensado, ambos, no coração e na mente, preparavam-se para o futuro ‘esperado’. E no tempo da demora se deu o acontecido...
Eu na frente! Quem chega primeiro? Eu! Eu! Eu! Nãoooo... eu vou! Eu vou! – Não eram tão loucos a esse ponto de saírem gritando correndo praia adentro essas palavras, talvez se o lugar não estivesse tão cheio de gente até o fariam, talvez até gritariam com as pessoas ali mesmo, afinal, quem se sente livre para viver não teme mostrar quem se é. Mas não, contiveram os gritos fônicos para berrarem tudo isso no consciente.
Enquanto caminhavam rumo ao mar, ela parecia apreensiva, levava um livro à mão... ele seguia, em sua praticidade apenas se ocupava em desviar dos obstáculos. Ao chegarem, um respiro profundo de ambos, um olhar ao horizonte... olhar distante, coração distante.. acontecia como que um despedir ou um esperar de alguém na estação rodoviária: era como se o mar fosse capaz de levar consigo um amor, uma dúvida, um cansaço, ou ainda, como se fosse competente o bastante para trazer um amor, uma dúvida... Não sei o que tinha aquele mar, mas sei, e sei bem porque vi ambos enamorados pela imensidão diante da qual se encontravam.
Depois de um momento nostálgico logo se propuseram a encontrar alguma coisa para forrar a areia e poderem se sentar; tão logo se viram deitados pela areia escapando o cerco do papelão que faziam como assento. É... às vezes chegamos com certas reservas, mas reservas, nem todas elas, algumas, precisam ser desfeitas para que se possa degustar o sabor indescritível que a liberdade nos propicia.
E ali deitados, como que em cadeira de praia, tinham uma visão dividida entre o céu e o mar... hora olhavam as estrelas, hora olhavam o mar que parecia estar meio revoltado naquela noite, com ondas fortes, altas, assustador, mas encantador... os paradoxos mostrando mais uma vez a verdade, embora fosse assombroso pensar nadar naquele mar bravio era como se ele os atraísse... causava em quem o contemplava medo e coragem. Assustava, mas não os fazia correr...os fazia penetrar com os olhos no profundo daquelas águas. Não sei, mas acho que, de certa forma,viam-se ali.
Diante de tamanha cena as palavras eram poucas...o silêncio era quase que absoluto. Mas irrompeu esse silêncio o poema atrapalhado que se pôs a fazer o jovem rapaz: “as rosas são vermelhas e o mar é azul...” ainda pensava no que iria dizer depois quando ela interrompeu: “porque o mar tem que ser azul? Não pode ser amarelo?” – cá pra nós, nesse mundo tão cheio de respostas admiro quem tem a coragem de fazer perguntas.
E seguia ela: “as pessoas pensam que poemas são para passar mensagens. Poesia é para brincar com as palavras sua sonoridade e criar imagens...se fosse pra falar do que já existe, não precisaríamos de poesia..” inteligente da parte dela, ao menos achei. Ele ruminou a fala e juntos deram margem para brincadeira das palavras e foram dizendo, descrevendo o, até então, impensável para dizer o mundo que os cercava.

Depois de alguns minutos dessas elucubrações mentais, sentaram-se novamente e o silêncio mais uma vez os invadiu. Novamente um olhar para o horizonte, para as ondas que quebravam fortes. Uma onda, um silêncio e a palavra, sempre atrapalhada, do rapaz: “Poseidon parece irritado”, invadiu novamente a busca por si mesma que parecia fazer a moça.
Ela riu, e olhando a fúria de Poseidon expressa pelas ondas revoltas daquele mar passaram a pensar e a falar da vida... talvez da vida porque o mar muito se assemelha a ela. Por ser tarde a maré já subia, na inocência de criança que se arrisca a brincar com fogo sem saber o perigo que ele pode lhe trazer enquanto conversavam, não sei, mas acho que Poseidon quis por fim no papo, talvez ele quisesse descansar um pouco, mas as palavras e risos daqueles dois o incomodasse. Uma onda quebrou forte e veio em direção aos dois... cena engraçada se sucedeu.
Ao tentarem correr levaram uma rasteira da onda e como tartarugas de barriga pra cima foram arrastados para trás. Molhados, pesados por água e areia... “Poseidon, seu filho de uma mãe! Eu te pegooo” diziam entre risos gargalhados. Depois desse balde de água fria, literalmente, colocaram-se a caminho e voltaram para casa.
Pra surpresa do rapaz, sem que se desse conta, o mar levara seus óculos naquele assalto da onda... saldo da ida ao mar: não só a planta dos pés molhada, mas sim parte da perna e grande parte das costas; um óculos a menos, somando isso descobre-se que só aconteceu porque estavam tentando viver diferente, ainda que num momento, a vida.
Assim, o saldo é positivo. Quantas vezes as ondas revoltas da vida também parecem levar de nós coisas, situações, pessoas... vai levando tão aos poucos que nem percebemos, ou nos tira num assalto e ainda assim levamos um tempo para acreditar que aquilo aconteceu. Com isso nossa visão se turva, mas se firmarmos bem os olhos seremos capazes de ver e vendo encontramos novas coisas, situações, pessoas que novamente nos ajudam a enxergar melhor e sem muito esforço que as mesmas ondas que levam também podem trazer.
O ponto de partida se faz chegada e no porto da vida sempre esperamos a embarcação que constantemente traz o sentido para nossa história. Os dois? Ainda hoje ao sacudirem as roupas usadas naquela noite encontram um punhadinho de areia...

Um comentário:

  1. "Nesse mundo tão cheio de respostas admiro quem tem a coragem de fazer perguntas".
    Parabéns Robson, pelo texto. Um grande abraço!!!

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